quarta-feira, dezembro 31, 2003

FELIZ ANO NOVO!

Não promete nada de novo. Tudo aponta que será mais um ano com muito mais do mesmo. É inevitável, assim como é inevitável que ficaremos mais velhos, mas também não é um determinismo e, por isso, está nas nossas mãos colocar uma areia na engrenagem e fazer de 2004 um ano em que a realidade se possa tornar menos bestial e, por isso, mais Humana.


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terça-feira, dezembro 30, 2003

DESTAQUES

Pronto, hoje virei para aqui, não é um balanço, mas acabei de visitar o Silêncio e o Rain Song e achei-os simplesmente lindos.

Não é a primeira vez que, depois de uma visita fugaz, destaco aqui este ou aquele blogue, que me desculpem todos os outros, sobretudo os que fazem parte da nossa lista de blogues de estimação, mas hoje são estes dois excelentes blogues que eu quero destacar.

O primeiro lembra-nos quão ensurdecedor pode ser o silêncio, o segundo trouxe-me à lembrança um excelente album do Tom Waits, Rain Dogs.

Apesar de ser um pouco ridículo, este passar a mão pelo pelo uns aos outros, mas como já dizia Fernando Pessoa, todas as cartas de amor são ridículas, mas nem por isso deixou de escrevê-las, por isso não me importo de correr o risco.


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OS MELHORES DE 2003

Para quê puxar pela carola? Todos ao Barnabé comentar os Globos d'Ouro 2003.

Também a não perder o "Memorial do Palheiro 2004" no Jumento.

Dêm uma olhadela ao balanço do ano 2003 do Intimista.

Caramba! Acho que vou ficar por aqui, senão não tenho espaço para tanta citação.


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domingo, dezembro 28, 2003

CICLO MANUEL BANDEIRA (1886-1968) - III

Este poema foi retirado do seu livro "Carnaval", o qual me parece vir a propósito deste final de ano.


BACANAL

Quero beber! Cantar asneiras
No esto brutal das bebedeiras
Que tudo emborca e faz em caco...
Evoé Baco!

Lá se me parte a alma levada
No torvelim da mascarada,
A gargalhar em doido assomo...
Evoé Momo!

Lancem-na toda, multicores,
As serpentinas dos amores,
Cobras de lívidos venenos...
Evoé Vénus!

Se perguntarem: Que mais queres,
Além de versos e mulheres?...
- Vinhos!... O vinho que é meu fraco!...
Evoé Baco!

O alfange rútilo da lua,
Por degolar a nuca nua
Que me alucina e que eu não domo!...
Evoé Momo!

A Lira etérea, a grande Lira!...
Por que eu extático desfira
Em seu louvor versos obscenos,
Evoé Vénus!

(1918)


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sexta-feira, dezembro 26, 2003

O MUNDO REDUZIDO AO TAMANHO DE UMA ALDEIA

Este post foi-me enviado por um amigo, mas provavelmente já anda a circular pela net à velocidade da luz, contudo não deixa de ser um excelente ponto de partida para uma reflexão mais profunda.

Apesar de, num certo sentido, o texto que se segue poder ser considerado redutor, o importante é realçar a necessidade que temos de conviver, com tolerância, com uma diversidade que é muito maior do que às vezes imaginamos, do mesmo modo ajuda-nos a compreender a grande desigualdade que existe no mundo.

Então cá vai ele:

Para reflectir nesta quadra (os bons sentimentos ficam-nos bem, pelo menos uma vez por ano):

Se fosse possível reduzir a população do mundo inteiro a uma aldeia de 100 pessoas, mantendo a actual proporção dos habitantes do planeta, tal povoação seria composta de:

57 Asiáticos
21 Europeus
14 Americanos (Norte, Centro e Sul)
8 Africanos.
52 seriam mulheres
48 homens.
70 não brancos
30 brancos.
70 não cristãos
30 cristãos.
89 seriam heterossexuais
11 seriam homossexuais.
6 pessoas possuiriam 59% da riqueza total, e todas as seis seriam dos EUA.
80 viveriam em casas inabitáveis
70 seriam analfabetos
50 sofreriam de desnutrição
1 estaria para morrer
1 estaria para nascer
1 teria computador
1 teria formação universitária.

Se o mundo for considerado sob esta perspectiva, a necessidade de aceitação, compreensão, educação e desenvolvimento torna-se evidente.

Considera ainda que, se acordaste hoje mais saudável que doente, tens mais sorte que um milhão de pessoas, que não verão a próxima semana.

Se nunca experimentaste o perigo de uma batalha, a solidão de uma prisão, a agonia da tortura, a dor da fome, tens mais sorte que 500 milhões de habitantes da Terra.

Se podes ir à igreja sem o medo de ser bombardeado, preso ou torturado, tens mais sorte que 3 milhões de pessoas no planeta.

Se tens comida no frigorífico, roupa no armário, um tecto sobre a cabeça, um lugar para dormir, considera-te mais rico que 75% dos habitantes deste mundo.

Se tiveres dinheiro no banco, na carteira ou uns trocos em qualquer parte, considera-te entre os 8% das pessoas com a melhor qualidade de vida em todo o mundo.

Se puderes ler esta mensagem, recebeste uma dupla benção, pois alguém pensou em ti e tu não estás entre os dois mil milhões de pessoas que não sabem ler.

Criemos um mundo mais tolerante, próspero e humano.

Façamos do Homem a medida de todas as coisas.

Bom Natal e Feliz Novo Ano (evitem estragá-lo, por favor!)


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segunda-feira, dezembro 22, 2003

REFERENDO

Novo referendo sobre o aborto.

Ouve-se dizer que o paí­s vai ser, de novo, referendado sobre o aborto. Ao que consegui apurar, a questão que será exposta aos cidadãos já está formulada e é aqui avançada em primeira mão. A saber: Qual a sua opinião sobre o aborto?

a) Tem sido um bom primeiro-ministro.
b) Tem sido um primeiro-ministro ineficaz.
c) Nem sequer tem sido primeiro-ministro.


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FELIZ NATAL - V

Amigos/as,

É Dezembro. Altura de ser bom, diz-nos Gedeão. Para lá dos muros de pobreza e esquecimento, é uma época em que as cidades são invadidas por cheiros fortes, sólidos, burgueses. A identidade religiosa é uma mera reminiscência simbólica: é uma noite de consenso e isso basta. Nos vãos dos deserdados, as ruas e a fome são mais largas. O frio do Norte, a maior das densidades. Porque o natal de uns poucos continua a ser a celebração da miséria para tantos outros: para demasiados outros. Nos sulcos dos despojos, sejamos a memória desse esquecimento. E a parte que permanece em falta na construção de um mundo mais justo e igualitário.

Votos de um natal solidário e progressista,


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RCTS CENSURA BLOGS?



O Blog Dois Dedos de Conversa denuncia a censura que é feita aos blogs pelo RCTS.

O RCTS é um serviço estatal que fornece a Internet às Escolas.

Qual a justificação?

Esta censura é extensiva a todos os Blogues ou só àqueles que empreguem uma ou outra palavra ou frase dita menos própria?

Seja como for é necessário que o RCTS esteja atento a este tipo de filtragens e, em simultâneo, acrescente na sua base de dados aqueles endereços que, lá por empregarem uma ou outra palavra, ou frase, considerada menos própria não são na realidade sites pornográficos ou de conteúdo impróprio.

Vamos ficar atentos à evolução dos acontecimentos e voltaremos a falar no assunto se necessário.


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FELIZ NATAL - IV



Feliz Natal é o que não terão as vítimas dos acidentes de viação que, ao longo do ano, mas particularmente em épocas festivas crescem para números assustadores.


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A FARSA DO NATAL

Sempre me resguardei das festas natalinas. Mesmo quando a presença de meus pais justificava a alegria da chegada de mais um ano.

Natal dos homens!...esse animal estúpido que faz da hipocrisia a bandeira de todos os seus atos.

Em nenhum outro momento o ser humano é mais ingênuo e comparsa da mentira. Quantos natais já passaram desde que a Igreja inventou um Cristo, filho de Deus, que morreu na cruz para nos salvar ?...O que mudou para melhor depois da encenação que se repete há 2000 anos ? – Nada.

O mundo civilizado e cristão continua obtendo os mesmos resultados deploráveis...; trocaram os métodos, pintaram a fachada e modernizaram o mecanismo de exploração do homem pelo homem... Mas o chavão enganador continua funcionando, agora, com o auxílio de efeitos pirotécnicos: FELIZ NATAL !

Aqui – onde dizem: Deus é brasileiro – nesses 500 anos de calamidade, estamos entregues à farsa de canalhas, profissionais do embuste; assistimos à encenação circense de novas igrejas que proliferam assegurando seu comércio à custa da ignorância do povo; crianças famintas, velhos desamparados, mulheres prostituídas, violência... Faltam saúde, escola, trabalho, panela no fogo. Falta Esperança...

Tudo avalizado pelo Poder que se concentra cada vez mais nas mãos de uma casta inescrupulosa e ordinária, sem o mínimo de sensibilidade e respeito para com a miséria que se agrava e – quem sabe ? – poderá destrui-la um dia...

Neste Natal, pois, o meu protesto. O meu desapontamento solitário. O meu desabafo inoperante, mas justo!...

Já que não se pode vencer (disse Vargas Vila), tenhamos a grandeza de ultrajar. O raio fere, por igual, os leões e as ovelhas; porém o leão ruge e a ovelha morre em silêncio... É sempre bela a garra do leão estendida na direção do raio que o aniquila!...


Fernando Augusto Barbosa Pontes
fernandoso@secrel.com.br

colocado por Isa


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SEM ABRIGO

Num dos noticiários televisivos de hoje deu uma reportagem sobre os sem abrigo. Estava distraído a ler o jornal quando uma voz serena me despertou e obrigou-me a prestar atenção.

Tratava-se de uma instituição de solidariedade social que, nesta época natalícia, tentava fazer chegar algum confortos aos sem abrigo da cidade do Porto. Entretanto alguns dos visados vão dando a sua opinião para as câmaras. Um deles, o que me despertou, diz: "Não sou um marginal, mas sim um marginalizado. Tenho 54 anos e dizem que já não sirvo para a vida activa, mas eu sei que sim, que ainda sou muito válido, mas ninguém me dá emprego. Estou aqui, mas tento viver com dignidade."

De facto aquele homem de rosto simpático deu-nos a todos uma lição de humanidade e de dignidade. O que ele pretendia não era uma qualquer esmola, mas afirmar a sua indignação perante a indiferença dos outros (sobretudo daqueles que dão mais importância à morte da princesa Diana, aos amores do Carlos Cruz, ou às festas da Lili Caneças, do que às suas próprias vidas) esses ao contrário daquele não merecem o nosso respeito.

O meu obrigado a esse sem abrigo que hoje me deu, nos deu, uma lição de dignidade. Como já alguém disse não me dêm o peixe, ensinem-me a pescar.

Ajudem dignamente os sem abrigo comprando regularmente a excelente revista CAIS e já agora não passem ao lado deles, comprimentem-nos, falem com eles, nem imaginam as lições de vida de humildade, de orgulh, de independência que poderão colher de muitos deles.

Pelo direito à dignidade!


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quarta-feira, dezembro 17, 2003

FELIZ NATAL - III



Também não poderão ter dias e natais felizes todos aqueles que foram vítimas civis e inocentes das armas de destruição massiva utilizada pelos mais diversos países e dirigentes políticos ao longo das últimas 6 ou 7 décadas.


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terça-feira, dezembro 16, 2003

APLAUDO

Fim da manhã. Resolvi fazer uma rápida visita a alguns (poucos, o tempo não deu para mais) a alguns blogs que constam da minha lista de links.

Deparei com alguns posts muito interessantes, dos quais destaco os seguintes: "Natureza Humana" (15-12-2003) na Quinta Coluna, "Duas Paredes" (15-12-2003) na Voz do Deserto, "Prisão de Saddam" (14-12-2003) e "Como Muitas Vezes Acontece" (13-12-2003) no Abrupto.

De facto estes posts são excelentes para lançar a reflexão sobre a nossa condição de humanos.


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segunda-feira, dezembro 15, 2003

FELIZ NATAL - II



Um feliz Natal ou um feliz qualquer outro dia, é o que não vão ter milhares e milhares de crianças palestinianas ou israelitas que, todos os dias, são obrigadas a viver na intolerância, no ódio e no fanatismo.


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FELIZ NATAL - I


A época natalícia deixa-me sempre transtornado. Transtornado porque a propósito da solidariedade, da paz e do amor se diz, e se escreve, tanta palavra bonita, mas que cheiram, quase sempre a falso, a demagogia e hipocrisia, isto idependentemente de quem as profere, sejam católicos, cristãos, agnósticos, ateus ou crentes em uma qualquer religião, pois embora o Natal seja uma festa cristã o facto é que a massificação, o mercado e a globalização, já a tornaram numa festa quase universal e as mesmas declarações de intenções ouvem-se nos quatro cantos do Mundo.

Como não gosto de ficar pelas intenções, mas como também não gosto de exprimir o que não sinto vou deixar aqui, nos próximos dias, alguns postais de boas festas. As imagens podem ser fortes, mas não vejo outra forma de denunciar as falsas intenções daqueles que, a propósito desta época, seraficamente, nos desejam constantemente bom Natal.


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domingo, dezembro 14, 2003

SADDAM FOI PRESO!

Saddam Hussein foi finalmente preso. É menos um ditador (dos autênticos) em liberdade, agora falta libertar a Humanidade dos outros (visíveis ou invisíveis).

Depois da prisão de Saddam pergunto: onde estão as armas de destruição massiva?

Resolvido o problema Saddam, resta agora resolver o problema da ocupação do Iraque.

Hoje é um dia bom para a Humanidade!


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A PROPÓSITO DA REPÚBLICA DAS BANANAS E OUTRAS HISTÓRIAS EDIFICANTES

Este texto chegou às minhas mãos através de um amigo, o autor é desconhecido, pelo menos para nós, mas certamente que não se importará que o divulguemos.

1. A jornalista Maria João Ruela foi, por indicação da sua entidade patronal, para o Iraque fazer uma reportagem sobre um país em guerra. A jornalista Maria João Ruela, e sua entidade patronal, sabem que nas guerras existem probabilidades, um pouco mais "prováveis" de acontecer, de se ser ferido, morto ou assaltado, do que se estiver a fazer uma reportagem sobre a desaparecimento das urgências de pediatria no hospital de Santa Maria. A jornalista Maria João Ruela foi ferida e assaltada enquanto exercia o seu trabalho de jornalista para a sua entidade patronal. A jornalista Maria João Ruela foi evacuada para o Kuweit, onde foi assistida num hospital local. A jornalista Maria João Ruela foi re-evacuada (isto é, evacuada depois de já ter sido evacuada) de um hospital no Kuweit para um hospital em Portugal, para evacuar a jornalista Maria João Ruela foi enviado um avião do INEM (sim, parece que tem um...) de propósito ao hospital do Kuweit para trazer a senhora para um hospital de Portugal.

2. Se o pedreiro José Maria se ferir num acidente de trabalho em Angola (onde a assistência médica está longe de ser igual á do Kuweit...) o INEM vai mandar um avião? Se o pescador Luís Pisco se ferir na pesca do bacalhau na Terra Nova, o INEM vai mandar um avião à Gronelândia? Se uma criança de Odivelas necessitar de atendimento urgente num dia de greve nos transportes e, por o hospital D. Estefânia (que agora é o único com urgência pediátrica...) que está numa zona de difícil acesso rodoviário, estiver inacessível em tempo útil... o INEM vai enviar um avião a Odivelas? Se tu, que pagas os mesmo impostos que a jornalista Maria João Ruela (que foi para o Iraque trabalhar, como tu vais para o trabalho todos os dias) tiveres um acidente de trabalho, o INEM vai buscar-te de avião?

3. O jornalismo português que é tão zeloso quando se gasta o dinheiro dos contribuintes... agora está calado????? O jornalismo português tão ávido de sangue quando se trata de matar o nome de qualquer cidadão distraído... agora está calado? O jornalismo português que conseguiu a proeza de mandar um batalhão de jornalistas que só conseguiam fazer reportagem... sobre os outros jornalistas... agora não escreve sobre esta jornalista? O jornalismo português que tanto gosta da concorrência entre si... agora está de acordo? O jornalismo português tem espinha? O jornalismo português tem moral? O jornalismo português sabe o que é a independência? O jornalismo português, que já tinha inventado a forma peculiar de dar notícias ao estilo: morreram 3 pessoas e 1 jornalista, agora tem uma razão para se sentir realizado: os jornalistas, de facto, não são pessoas (pelo menos pessoas como os outros humildes mortais...)

4. Seria bom que o governo português que justificou o fecho da urgência pediátrica de Santa Maria (por sinal o hospital com o melhor serviço de pediatria e neo-natalidade de Lisboa) por razões económicas, tivesse utilizado aquele dinheiro para manter o serviço aberto e deixasse a jornalista Maria João Ruela se restabelecer no hospital do Kuweit (que é
excelente!!!!!!!!!!!) e viesse para Portugal, num avião comercial, depois de restabelecida..... a saúde das nossas crianças ficaria agradecida...

5. Que m*%&! de república das bananas em que vivemos...


Evidentemente que este texto é redutor, mas não deixa de colocar o dedo na ferida quando salienta a diferença de tratamento de que são alvo os cidadãos portugueses, assim como deixa implicita a pergunta: mas afinal vamos poupar em quê?

Como seria bom que não se esbanjasse dinheiro em manobras de propaganda e se cumprisses prioridades em relação às necessidades mais elementares e básicas dos Portugueses.

Xanana Gusmão disse há dias que não existia democracia onde houvesse gente com fome, sem habitação, sem direito ao ensino ou à saúde (a ordem não era esta, mas também, para o caso, é indiferente). Quero com isto dizer que a democracia não se afirma pela retórica dos pseudo detentores da verdade (dogmas), mas sim pela concretização das necessidades básicas dos cidadãos em resultado da dialéctica que estes estabelecem com o poder, fruto do seu exercício da cidadania. No entanto é conveniente realçar que não defendo a paralização de um povo à espera que todos cheguem àquele estado, para depois partir para outro. É necessária uma dinâmica constante, mas em que a prioridade seja sempre para os mais necessitados, os outros têm outros meios que lhes permite ultrapassar a maior parte das dificuldades.


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sexta-feira, dezembro 12, 2003

NATAL DE UM ANO QUALQUER

NATAL DE 1971

Natal de quê? De quem?
Daqueles que o não têm?
Dos que não são cristãos?
Ou de quem traz às costas
as cinzas de milhões?
Natal de paz agora
nesta terra de sangue?
Natal de liberdade
num mundo de oprimidos?
Natal de uma justiça
roubada sempre a todos?
Natal de ser-se igual
em ser-se concebido,
em de um ventre nascer-se,
em por de amor sofrer-se,
em de morte morrer-se,
e de ser-se esquecido?
Natal de caridade,
quando a fome ainda mata?
Natal de qual esperança
num mundo todo bombas?
Natal de honesta fé,
com gente que é traição,
vil ódio, mesquinhez,
e até Natal de amor?
Natal de quê? De quem?
Daqueles que o não têm,
ou dos que olhando ao longe
sonham de humana vida
um mundo que não há?
Ou dos que se torturam
e torturados são
na crença de que os homens
devem estender-se a mão?


Jorge de Sena, in Exorcismos


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quarta-feira, dezembro 10, 2003

O AÇOUGE

Resolvi seguir a sugestão do Fernando Alves nos Sinais de hoje na TSF. Fui visitar o açougue e garanto-vos que vim de lá com carne de primeiríssima qualidade.

O link para este sítio (T-Bone) ficará permanentemente na lista aqui ao lado, na secção "Outros Sítios". Façam uma visita e sirvam-se.


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segunda-feira, dezembro 08, 2003

CICLO JOSÉ RÉGIO (1901-1969) - II



PAINEL

Ora uma noite de luar medonho
(Lembro-me disto como de um sonho)
Alevantou-se um Homem a meu lado,
Todo nu, e desfigurado.

Mal me atrevendo a olhá-lo, eu quase só adivinhava
Seu corpo devastado que sangrava…
E uma lembrança, longe, longe, havia em mim
De já o ter amado, ou outro assim.

Seu rosto, que, decerto, era sereno e puro,
Resplandecia, como um mármore, no escuro;
E as suas lágrimas, rolando devagar,
Deixavam rastos que faziam luar…

Eu prosseguia, todo trémulo e confuso,
Cheio de amor e de terror por esse intruso.
À minha mão direita, ele avançava aereamente,
Com seu ar espectral e transcendente…

Os seus pés nem pousavam no caminho;
E então, eu desatei a soluçar baixinho,
Porque notara que em seu rosto exangue
As suas lágrimas corriam misturadas com o sangue.

Oh, onde a vira eu, essa figura peregrina
Feita de terra humana e de ascensão divina?
Sim, onde a vira eu, que, só de o perguntar,
Me arrepiava, com vertigens de ajoelhar?

Mas, de repente, como um sobressalto,
E como a angústia de quem rola muito de alto,
Alguma coisa em mim passou, que pressentia,
E que se arrepelava, e que tremia…

É que em meu ombro esquerdo "alguém" se debruçava,
Alguém que ria um riso que espantava,
Um riso tenebroso, e cheio de atracção,
Com fogo dentro como a boca de um vulcão!

E sem o ver, eu vi-o, todo inteiro,
Essoutro novo e inseparável companheiro:
Um que também conheço, nem sei donde nem de quando,
Por mais que me torture procurando…

E tinha pés de cabra, e tinha chifres, tinha pêlos,
E tinha olhos sulfúricos, esfíngicos e belos…
A baba do seu riso escorregava-lhe da boca,
E em todo ele ardia uma lascívia louca!

À minha mão direita, absorto aéreo, hirto,
Coroado de abrolhos e de mirto,
O Outro continuava a chorar lágrimas caladas,
Com as mãos lassas como rosas desfloradas…

Entre os dois, eu sentia-me pequeno e miserando,
Vibrando todo, tumultuando, soluçando,
Com olhos meigos, lábios torpes – indeciso
Entre um inferno e um paraíso!

Um riso doido e cínico, sem regra,
Subia em mim como uma onda negra,
E estrelados de lágrimas, meus olhos inocentes
Ajoelhavam como penitentes…

Entretanto os dois vultos desmedidos
Iam crescendo entre os meus risos e gemidos,
Crescendo sempre, sempre e tanto, que, depois,
Eu ficava esmagado entre eles dois.

A noite em que isto foi, não sei…, sei lá?... (Seria
Essa em que minha Mãe, com tanta angústia, me paria…)
Sei que o luar era medonho, era amarelo,
E que tudo isto me parece um pesadelo!


José Régio


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domingo, dezembro 07, 2003

CONVERSAÇÃO

E então o sábio disse: Fala-nos da conversação. E ele respondeu, dizendo:

Vós falais quando cessais de estar em paz com vossos pensamentos; e quando não mais podeis viver na solidão de vosso coração, viveis em vossos lábios, e o som que emana é uma diversão e um passatempo.

E em grande parte de vossas conversas, o pensamento é um tanto quanto aniquilado.

Pois o pensamento é uma ave do espaço, quando preso numa gaiola de palavras somente pode abrir suas asas sem poder voar.


Kalil Gibran

colocado por Isa


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sexta-feira, dezembro 05, 2003

CICLO FERNANDO PESSOA (1888-1935) - VIII



Navegadores antigos tinham uma frase gloriosa:
"Navegar é preciso; viver não é preciso."

Quero para mim o espírito desta frase, transformada a forma para a casar com o que eu sou:
Viver não é necessário;
o que é necessário é criar.

Não conto gozar a minha vida;
nem em gozá-la penso.
Só quero torná-la grande,
ainda que para isso tenha de ser o meu corpo e a minha alma a lenha desse fogo.

Só quero torná-la de toda a humanidade;
ainda que para isso tenha de a perder como minha.

Cada vez mais assim penso.
Cada vez mais ponho na essência anímica do meu sangue o propósito impessoal de engrandecer a pátria e contribuir para a evolução da humanidade.


Fernando Pessoa


colocado por Isa


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quinta-feira, dezembro 04, 2003

O RENDER DA GUARDA



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