sexta-feira, fevereiro 27, 2004

O AMOR DAS FÊMEAS


Um destes dias descobri, meio perdida numa das prateleiras de casa, uma antologia intitulada Poesia Portuguesa Erótica e Satírica (Séculos XVIII e XIX), com selecção, prefácio e notas de José Martins Garcia, magnificamente ilustrada por Henrique Manuel e editada por Fernando Ribeiro de Melo/Edições Afrodite nos idos de 1975.

Esta compilação é simplesmente deliciosa e as anotações de José Martins Garcia são divinais. Prometo que mais tarde voltarei a pegar neste tema para explorar as notas referidas. Hoje escolhi servir-vos como aperitivo um pequeno poema de um obscuro Xavier de Carvalho (1882-1919), cujo título coincide com o deste post. Sobre este autor diz José Martins Garcia: Um dia Xavier de Carvalho apercebeu-se de que as mulheres podiam prescindir do macho. Escreveu um poema. Não escreveu mais nada digno de registo.

Passemos então ao poema.

Amavam-se. E que longo amor tinham as duas,
Quando no leito, a sós, ambas se viam nuas,
ao romper da manhã!...

Os corpos brancos de uma alvura de novoeiro,
Apetitosos como os frutos em Janeiro
E os seios num contorno iriente de romã...

Enlaçavam depois os corpos. Boca a boca,
Trocavam docemente os mais vermelhos beijos,
Numa febre de amor, numa ternura louca,
Entre gritos do sangue e ardências dos desejos.

Noites brancas! Na sede ardentíssima do gozo,
Que frémitos! Da carne o insaciado ardor
Rói o sexo que explui, a crepitar, furioso,
Injectado de amor...


(Poesia humana)


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