quarta-feira, julho 21, 2004

Preconceito Racial

O Brasil é um país surrealista, sem encadeamento lógico em tudo que se possa imaginar.  Fala-se em preconceito de cor e vemos negros bem sucedidos não dispensarem a companhia das loiras em suas exibições mundanas; a grande maioria da população soteropolitana de pele negra  e cabelo pixaim auto-denominar-se “parda”, cor intermediária entre o branco e o preto... Isso serve para evidenciar, não um preconceito, mas um complexo fabricado internamente, suprindo uma gama de interesses múltiplos que a racionalidade não aceita, mormente quando se sabe que a população brasileira, como um todo, é constituída da miscigenação de brancos, negros e índios, na sua base vestibular.
 
O padre Antônio Vieira, em memorável discurso proferido na Câmara Federal, em abril de 1967, enfatiza: “...não existe raça superior ou raça inferior. Há sim povos mal e bem alimentados. Porque raça entra pela boca. Raça e ração são palavras que têm a mesma origem etimológica.”
 
Agora, abre-se no Congresso Nacional uma discussão no sentido de conceder reserva de vagas nas universidades públicas para estudantes afro-descendentes, como se fôssemos um país da Escandinávia com discriminação elevada ao patamar do absurdo. E para caracterizar um absurdo maior ainda, o senador petista Paulo Paim , em  pronunciamento transcrito no Jornal do Senado, ed. de 29.06.2004, argumenta: “Nós todos achamos que temos de investir no ensino público, mas acontece que o Estado não faz isso e o negro acaba sendo prejudicado e não tendo acesso ao ensino superior. É melhor ser discriminado  lá dentro do que aqui fora.”
 
Reconhece o senador que o governo não investe no ensino público (com muitos números e pouquíssima qualidade) e - sendo ele um dos integrantes dessa farsa petista que galgou o poder usando artifícios de esquerda - podemos concluir que em matéria de ensino, a coisa está “preta” e vai continuar “preta” por muito tempo ainda. A sua frase conclusiva torna-se um atestado de total irresponsabilidade, pois prega abertamente o preconceito com todas as letras ao afirmar que “é melhor” o negro ser discriminado lá dentro da universidade do que aqui fora. Nem negro, nem branco, nem pardo, nem índio devem sofrer discriminação onde quer que se encontrem: é princípio democrático e constitucional.
 
Sabemos que a aferição de conhecimentos é o processo mais transparente no acesso a qualquer nível de ensino. O básico, o elementar, o óbvio, é investir na escola pública em todos os graus e formar alunos capacitados a concorrer em pé de igualdade. Pouco importando que sejam eles brancos, pretos, amarelos, verdes, vermelhos ou azuis... Essa sucata de ensino que vem levando o País para a “casa do sem jeito”, comprometendo a sua soberania e transformando o cidadão comum  em refém da falta de perspectiva; limitando o jovem, humilhando o velho, confundindo a todos e oficializando a vergonha de ser brasileiro... é a causa primeira e maior dessa subserviência que os nossos governantes sustentam no jogo sujo do “poder a qualquer preço”. Esta, sim é a nossa mega  discriminação; o nosso grande preconceito e eterno complexo: lá fora e perante nós mesmos.
 
Fernando Augusto Barbosa Pontes p/Diário do Nordeste (19 de Julho de 2004)
 


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